Em minha vida toda nunca achei que veria um show do Paul McCartney.
Era algo inalcançável. Beatles era algo inalcançável, parecia mito.
Eu nasci ouvindo Beatles, cresci sabendo que aquilo era música, que aquilo era o começo de tudo, que antes disso não tinha nada muito relevante. Eles são a base pra qualquer outra coisa. Qualquer banda é inspirada nos Beatles direta ou indiretamente.
Então, como o John já havia morrido quando eu nasci e como Beatles já não existia mais há um bom tempo, eu achava simplesmente impossível, eles eram intocáveis.
Mas eu não ficava triste por causa disso, afinal era impossível, não havia nada que eu podia fazer, era simplesmente uma coisa distante, alta, num pedestal.
É como um amante de futebol que quisesse ver a seleção Brasileira de 58 jogar. Impossível assim.
Aí veio o show de São Paulo. Eu não sei exatamente qual lógica passou pela minha cabeça de pensar que eu não poderia arcar com as despesas disso. Não há desculpas pra não ir em um show do Paul. Eu venderia minha alma, se necessário. Só que eu só fui pensar melhor nisso depois dos ingressos esgotados. E aí eu vi o show pela TV, chorei demais. Devo ter passado umas duas semanas amargas, muito depressiva, não me perdoando por ter deixado essa chance única escapar.
Ah, que gosto delicioso de estar errada. Surgiu a confirmação do show no Rio. Foi tudo muito rápido, nem raciocinei bem, minha irmã e minha tia já programaram tudo, compraram tudo e pronto, estava tudo certo. Pronto, eu ia, era certo, absoluto. Só a morte me impediria disso.
A ficha demorou pra cair.
21.V.2011
Dava vontade de perguntar pras outras pessoas no ônibus "você também está indo ao show?".
Nas ruas do Rio eu identificava quem ia estar lá no dia seguinte também. Várias pessoas com camisetas dos Beatles e do Paul, vários sorrisos incrédulos, como o meu. Um clima indescritível.
22.V.2011
Acordei meio anestesiada. Fui dar uma volta no Aterro do Flamengo olhando bem cada um que passava de bicicleta. Depois teve o almoço na casa da tia Virgínia. Que clima. Já estava todo mundo meio emocionado, ver o Paul no DVD cantando Hey Jude e raciocinar que dali algumas horas aquilo seria real foi demais. Não aguentei. Chorei.
No metrô já havia um ar diferente, eu ficava tentando adivinhar quem estava indo pro mesmo lugar. Na Central do Brasil foi emocionante, cartazes, muita gente com seu uniforme de show, um fluxo na mesma direção e as pessoa de verde que indicavam o caminho e desejavam "bom show". Chegando no Engenhão, o primeiro coro, acompanhávamos um rapaz que tocava e cantava Twist and Shout. Ah, que clima! Que clima! Aí veio a fila, enorme e deliciosa, só alimentava esse clima. Uma fila de gente feliz, muito feliz. A monumentalidade do Engenhão também só ajudava. Depois de muito tempo de fila, de muita ansiedade, andamos calmamente para um lugar onde coubessem seis fãs bobo-alegres. Setor superior leste. Tocavam músicas dos Beatles cantadas por outras pessoas, lindas versões.
21:45 apagam-se as luzes. Fiquei em pé, coração na mão. You say yes, I say no, you say stop but I say go, go, go. Minha mente não acreditava, parei de sentir meu corpo, as lágrimas escorriam incessantemente, a voz não saía direito. Foi aí que caiu a ficha. Durante umas três músicas eu chorei sem parar. Depois acho que as lágrimas secaram, mas a cada música que começava eu pensava "não acredito que estou ouvindo isso" e dava outro nó na garganta. Ele conversava com a plateia e eu sentia como se fosse diretamente comigo, e respondia como se ele ouvisse apenas a mim. E cantava com força pra ter certeza que eu fazia parte do coro todo que o estava acompanhando. Eu o medi, cabia entre meus dedos, tinha cerca de 1,5cm de altura de onde eu estava. Muito longe? Não. Muito, muito perto. Muito mais perto do que qualquer sonho que eu nem tive, por nunca achar que seria possível ver, ouvir e cantar junto com aquele que compôs Hey Jude. Eu estava vendo um dos four lads who shook the world. De Liverpool para mim. Para mim!
E senti como se o John estivesse lá em Here Today. For you were in my song.
Eu ainda não acredito completamente.
I don't know why you say goodbye I say hello.
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